Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar, senão a
mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida e eu
sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado. Quero só que surjas
em mim como a fé nos desesperados para que eu possa levar uma gota de orvalho
nesta terra amaldiçoada que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande
íntimo da noite. Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua
fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço e eu
trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir e todas as lamentações do mar, do vento, do céu,
das aves, das estrelas serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz
perenizada.
(Martha Medeiros)
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