segunda-feira, 29 de julho de 2013

METADE

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio;
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca; 
Porque metade de mim é o que eu grito,
Mas a outra metade é silêncio...

Que a música que eu ouço ao longe
Seja linda, ainda que tristeza;
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada 
Mesmo que distante;
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade...

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece
E nem repetidas com fervor,
Apenas respeitadas como a única coisa que resta 
A um homem inundado de sentimentos;
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo...

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço;
E que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada;
Porque metade de mim é o que penso 
Mas a outra metade é um vulcão...

Que o medo da solidão se afaste
E que o convívio comigo mesmo
Se torne ao menos suportável;
Que o espelho reflita em meu rosto
Um doce sorriso que me lembro ter dado na infância;
Porque metade de mim é a lembrança do que fui,
A outra metade eu não sei...

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria 
para me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais;
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço...

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade para faze-la florescer;
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção...

E que a minha loucura seja perdoada 
Porque metade de mim é amor
E a outra metade... também.


(Oswaldo Montenegro)

Depressão

Tenho uma depressão,
que me queima a alma,
seca-me o sangue, 
seca-me o coração,
aperta-me o peito contra uma rocha,
fere-me o corpo com a escuridão,
deste castelo que é esta vida maldita e bela,
com fome e tudo e nada.

Sinto-me gelada, 
arder no fogo de um tronco da árvore,
do poço profundo que é a minha alma,
olho para mim e não me reconheço,
já não sei quem sou,
serei um pedaço de carne podre sem sangue sem alma.

Neste mundo selvagem e feio,
como uma peste de inveja e ódio,
sinto a minha alma gelada e morta,
como se fosse as águas do rio,
choram de amor, choram de frio,
choram por tudo e por nada.